Nesta segunda-feira (5), o Supremo Tribunal Federal (STF) dá início à primeira audiência de mediação referente ao marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O processo tem sido alvo de críticas por parte de representantes das comunidades indígenas, que questionam a condução da mediação pelo ministro Gilmar Mendes.
Mendes atua como relator das ações que abordam a constitucionalidade da lei do marco temporal, que foi anulada pelo STF em setembro do ano anterior. Em abril deste ano, Mendes interrompeu a tramitação de todas as ações relacionadas ao tema e iniciou um processo de mediação.
Os representantes indígenas demonstraram forte oposição à decisão de Mendes, solicitando a suspensão temporária da lei e a redistribuição das ações para o ministro Edson Fachin. Eles alegam que Mendes não analisou seus pedidos nem os levou ao plenário do tribunal. Fachin, relator do processo original sobre o marco temporal, já expressou sua visão de que a tese é inconstitucional.
Apesar de ter votado contra a tese do marco temporal durante o julgamento, Mendes ressaltou preocupações sobre a extensão das demarcações, argumentando que "não é a falta de terra" que afeta os indígenas, mas sim "a ausência de suporte estrutural". Mendes é percebido como alinhado aos interesses do setor agropecuário no STF.
A tese do marco temporal sustenta que os indígenas só têm direito às terras que ocupavam em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou às terras em disputa judicial na época.
Contexto e Controvérsias
Em dezembro passado, o Congresso Nacional rejeitou o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao projeto de lei que ratificou o marco temporal. Antes da decisão dos parlamentares, o STF havia se posicionado contra o marco, influenciando o veto presidencial.
A decisão de encaminhar o caso para mediação foi apresentada ao plenário, mas o julgamento foi suspenso pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF. Agora, cabe a ele estabelecer uma nova data.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) criticou a falta de consideração das questões levantadas nos embargos, afirmando que isso compromete a possibilidade de mediação. A Apib salientou que os povos indígenas estão sendo direcionados para uma conciliação incerta e precária, sem uma metodologia clara.
Reações e Preocupações
Indígenas e parlamentares se encontraram com Fachin em julho para abordar preocupações em relação ao processo de mediação. O coordenador jurídico da Apib, Maurício Terena, criticou a postura de Mendes, enquanto Dinaman Tuxá, coordenador executivo da entidade, afirmou que os indígenas estão ingressando na negociação em desvantagem.
A Apib reiterou o pedido de suspensão da lei, argumentando que há um "risco de dano irreversível à vida e à existência dos povos indígenas do Brasil". A petição também alerta que a demora na resolução da controvérsia pode resultar na responsabilização do estado brasileiro por organismos internacionais de defesa dos Direitos Humanos.
Outra demanda da Apib é que a Procuradoria-Geral da República (PGR) possa participar com direito a voz e voto na comissão de mediação. Conforme a decisão de Mendes, um representante da PGR participará apenas como observador, o que a Apib considera insuficiente para garantir os direitos dos povos indígenas.
Posições Divergentes
A Advocacia-Geral da União (AGU) concordou com a tentativa de acordo, mas ressaltou que a tese do marco temporal é "irreconciliável". O ministro Jorge Messias sugeriu que a negociação poderia se concentrar nos aspectos patrimoniais da lei, desde que respeitadas as decisões do STF.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, manifestou que irá opinar sobre o assunto principal somente após a conclusão dos trabalhos da comissão especial, defendendo que a relatoria do processo permaneça com Mendes.
Expectativas e Composição da Comissão
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), demonstrou entusiasmo com o esforço do STF em buscar uma mediação ao invés de simplesmente declarar a inconstitucionalidade da lei aprovada pelo Congresso. Mendes estabeleceu o dia 18 de dezembro como prazo final para a tentativa de acordo.
A comissão de mediação será formada por seis membros indicados pelo Congresso e seis pela Apib, além de representantes dos autores das ações, da União, dos Estados e municípios. O Senado escolheu Jaques Wagner (PT-BA) e Tereza Cristina (PP-MS), enquanto a Câmara ainda não designou seus representantes.
Dos quatro processos em andamento, três foram movidos por partidos de esquerda, buscando a inconstitucionalidade do marco temporal. A quarta ação, defendendo a validade da lei, é de autoria do PP, REPUBLICANOS e PL.
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